Monday, December 3, 2012

A dupla-boca


dupla boca + boca coletiva: ações em áudio nas lacunas da voz
Brandon LaBelle e Ricardo Basbaum


Nosso mecanismo vocal pode ser entendido como contendo duas bocas – uma, compreendendo a cavidade oral, incluindo a língua e os dentes, e articulada pela abertura e fechamento dos lábios; e outra, aquela da glote, com a abertura um pouco mais abaixo, na garganta, e que controla a pressão e modulação do fluxo de ar. A boca e as cordas vocais, os lábios e a glote: duas bocas, cada uma em sua relação com a fala, cada uma participando nas fricções e faculdades da vocalização. A dupla-boca pode ser destacada enquanto encontro do corpo e da linguagem, onde a glote como a boca interior (a carne corpórea) conversa com a boca exterior (a voz social), articulada pelos lábios.

Ao explorar esta dupla-boca, o projeto procura ocupar e amplificar o espaço intermediário – aquele intervalo onde corpo e linguagem se encontram, em que o interior se emancipa a partir da vibração da glote, para então viajar através da boca, estendendo-se através dos lábios em direção à enunciação. Todas as dinâmicas e intensidades que ocorrem nesse intervalo, este espaço entre entrada [in] e saída [out], a glote e os lábios, podem ser compreendidas através da história das poéticas do som, das performances vocais, o que de Certeau chama de "a ópera da glossolalia".

Além disso, quando dois corpos se relacionam um com o outro, a linguagem e os sentidos desempenham um papel nos processos de entrar em contato e se comunicar – isso constitui outra dupla-camada que envolve o corpo e o espaço-social, as ferramentas da comunicação e seus protocolos. Através desses protocolos, a boca é treinada socialmente para desempenhar e administrar a economia das várias camadas de contato que se abrem entre este corpo – seus sentidos e pulsões – e outros corpos. Aqui, a fala, a escrita e outras ferramentas e mediadores da comunicação e do contato movimentam e estendem o corpo para os territórios exteriores e o tornam multiplamente audível. Este seria um segundo aspecto da dupla-boca: aquele que empurra o corpo para seu lado de fora; a boca enquanto um lugar social exteriorizante.

Ao investigar esses intervalos, histórias e poéticas, o projeto se desenvolve como uma dupla- ou mesmo tripla-boca: colaborações em áudio entre estudantes de Bergen e do Rio de Janeiro.